
JUIZADO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE
“POR FALTA DE UM GRITO SE PERDE UMA BOIADA”
Canindé (CE), 23/05/2018.
Os
provérbios e ditados populares estão presentes em todas as culturas do
mundo, e são considerados objetos da sabedoria popular, possuindo função
social de aconselhar e advertir, ao mesmo tempo que transmitem
ensinamentos entre gerações, basicamente pela via oral, constituindo-se
em expressões da memória coletiva aceitas como verdades.
Exatamente
por isso, escolhi um proverbio popular bastante conhecido para chamar à
reflexão sobre um tema que considero importante e afeto à área da
segurança do trânsito, e ao mesmo tempo servirá para incutir a ideia de
que viver em sociedade, representa compartilhar responsabilidades,
socializar preocupações e buscar soluções para problemas, no caso
especifico, que afetam diretamente a ordem e a segurança do transito
neste Município.
Pois
bem, os fatos que adiante descreverei não se trata de nenhuma novidade,
pois um simples e atento passeio pelas ruas da cidade, especialmente
nos horários de início e termino das atividades escolares, é possível
detectar situações absurdas, irresponsáveis e inaceitáveis sob o ponto
de vista do respeito à legislação de transito e garantia dos direitos de
crianças e adolescentes.
Apenas
para que tenhamos a dimensão da irresponsabilidade dos condutores de
motocicletas (pais, mães e mototaxistas), somente num único dia, no
horário compreendido entre 6:40 às 08:10, num ponto da rodovia estadual CE257,
que passa em frente á escola profissionalizante e também nas
proximidades de uma creche, foi contabilizada a incrível marca de 38
(trinta e oito) motocicletas, cujos condutores e condutoras, inclusive, muitos mototaxistas, irresponsavelmente, conduziam crianças, inclusive de colo, nos seus veículos, alguns usando o próprio tanque de combustível do veículo como assento para a criança, ou colocando a criança, como se fosse um sanduiche, espremida entre dois adultos, ou ainda, pasmem e imaginem a situação, amarradas
nas costas ou no abdome do condutor ou da condutora do veículo,
mediante uma faixa envolvendo a criança, imitando um cinto de segurança,
situações com potencial e inegável probabilidade da ocorrência de
acidentes graves e com consequências irremediáveis, levando-se em
consideração, além da conduta irregular e irresponsável dos condutores, o
pavimento deteriorado da rodovia e o grande fluxo de veículos. Não
raramente, estas situações são presenciadas nas portas dos colégios e
escolas, como de resto, por toda a cidade e em qualquer horário, sem
falar no trafego de motocicletas na zona rural, que ultrapassa o senso
comum de responsabilidade e de razoabilidade, pois o braço da lei
(Código de Trânsito) e o poder fiscalizador do Poder Público não se
fazem presentes, fazendo parecer que as pessoas vivem numa terra sem lei
e sem autoridade.
Chama
à atenção a conduta dos mototaxistas, profissionais que, inegavelmente,
trabalham prestando um serviço essencial e importante à população,
mediante permissão do Poder Público para exploração do serviço de
transporte individual, entretanto, não estão autorizados descumprir a
legislação de transito, muito menos colocar em risco a vida de crianças,
que não possuem a mínima condição de prover a própria segurança para
ser transportada num veículo que exige redobrada atenção na sua
condução, tendo em vista as consequências quando envolvido num acidente
de transito, especialmente nas colisões, pois a fragilidade da
motocicleta pode acarretar sérios e graves danos ao condutor e
passageiro (garupeiro). Neste tipo de situação, os pais também são
corresponsáveis, quando permitem que o filho seja transportado de forma
irregular.
Apenas
para ilustrar esta breve mensagem, transcrevo algumas normas que se
aplicam aos fatos relatados, as quais, por certo, são do conhecimento
das autoridades e gestores públicos municipais:
Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei Federal nº 8.069/90
“Art. 5° - Nenhuma
criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na
forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos
fundamentais.
Art. 18 -
É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente,
pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento,
aterrorizante, vexatório ou constrangedor.
Art. 70 - É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente.
Art. 98 - As
medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre
que os direitos reconhecidos nesta Lei foram ameaçados ou violados:
I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
Il - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;
lII - em razão de sua conduta.”
Código de Trânsito Brasileiro – Lei Federal nº 9.503/97
“Art. 168 - Transportar crianças em veículo automotor sem observância das normas de segurança especiais estabelecidas neste Código:
Infração - gravíssima;
Penalidade - multa;
Medida administrativa - retenção do veículo até que a irregularidade seja sanada.
Art. 244 - Conduzir motocicleta, motoneta e ciclomotor:
I-...................................................................................................................;
II-…...............................................................................................................;
III-…..............................................................................................................;
IV-…..............................................................................................................;
V - transportando criança menor de sete anos ou que não tenha, nas circunstâncias, condições de cuidar de sua própria segurança:
Infração - gravíssima;
Penalidade - multa e suspensão do direito de dirigir;
Medida administrativa - Recolhimento do documento de habilitação;”
Ademais,
sabe-se que o mototaxista deve observar a legislação de trânsito, além
de cumprir outras normas especificas e decorrentes do exercício da
profissão, sob pena de perder a permissão para explorar o serviço de
transporte individual.
Não
é razoável e nem lógico admitir como normal as condutas enumeradas
acima, e penso que ninguém, em sã consciência, aprova submeter crianças a
toda espécie de riscos no trânsito, sob o fundamento de uma pretensa
economia de combustível em detrimento da segurança dos pequenos cidadãos
que são irregular e irresponsavelmente transportados diariamente nas
ruas desta Cidade e sob o olhar complacente de quem deveria coibir estes
abusos, inclusive, com a participação direta dos pais.
Deixo o alerta, porque tem sido uma pratica comum os pais transportarem crianças, seus próprios filhos,
em motocicletas com excesso de passageiro, sem capacete ou utilizando
de forma inadequada, sem qualquer preocupação com a vulnerabilidade e
fragilidade dos infantes, muito menos sem dá importância para o fato de
que transportar as crianças menores de sete anos em motocicletas, expõe
precocemente os meninos e meninas a um transporte automotor mais
propenso a acidentes de trânsito.
Nas
estatísticas de acidentes de trânsito, em qualquer cidade que tenha
movimentação razoável de veículos, geralmente os números demonstram que
os motociclistas lideram as ocorrências de óbitos, bem como os casos de
sequelas graves decorrentes dos acidentes envolvendo motocicletas,
evidenciando que se trata de um tema muito importante.
Dentro
deste contexto, a realidade reflete bem o quanto é perigosa à omissão, a
falta de coragem de gritar quando se faz preciso para que outros
acordem diante de fatos que tornam iminentes a ocorrência de acidentes
de trânsito com resultados trágicos.
Não
desconheço o importante trabalho desenvolvido pelos valorosos Agentes
de Trânsito da Guarda Civil Municipal, mas devo alertar que, no caso
específico, a inércia é sinônima de passividade, e descomprometimento
com o bem-estar e tranquilidade de centenas de condutores de veículos
que transitam nas ruas desta cidade, além de representar risco grave à
garantia dos direitos de crianças e adolescentes, que estão sendo
vitimas do descaso, inclusive por parte dos próprios pais.
Não
acredito que campanhas educativas resolvam o problema, até porque todos
já bem conhecem as irregularidades citadas, mas creio que uma
intervenção firme e determinada dos Agentes de Trânsito no sentido de
coibir rigorosamente os abusos e infrações que diariamente são
praticados e que podem ser facilmente constatados nas ruas da cidade,
inclusive junto aos mototaxistas no sentido de até mesmo revogar as
permissões concedidas pelo Poder Público, no caso de descumprimento de
suas obrigações, surtirá os efeitos esperados.
O
provérbio enunciado nesta mensagem nos remete a história da humanidade,
marcada por vários momentos em que foram os gritos de alerta e de
convocação para lutas que fizeram com que a história muitas vezes
tomasse outro curso.
Somos
conhecedores de muitos avanços e conquistas que se concretizaram graças
a um grito de chamamento, de advertência ou de incentivo ao combate do
perigo.
Não
pretende esta mensagem se tornar um grito para afugentar ou assustar,
porque assim faz dispersar, mas um grito que estimule o agrupamento, o
ajuntamento, a atitude coletiva, em direção a um mesmo caminho.
O
que não pode ocorrer é o trânsito ficar sem comando de direção, sem
definição do rumo a seguir, sem a força da união, do sentimento
unificado.
Lembrando
o provérbio, mais uma vez, sem o grito de encaminhamento da boiada, é
muito possível que ela se dirija para a trilha errada, e o que é pior,
dispersa, cada boi procurando encontrar seu próprio destino. Não
queremos que o transito desta cidade seja uma terra de ninguém e sem
lei, uma boiada sem grito!
Dentro
do contexto fático narrado, determinei que o comando da Guarda Civil
Municipal adote, imediatamente, providencias no sentido de intensificar,
diariamente, as ações de fiscalização dos Agentes de Trânsito para
coibir as condutas acima relacionadas, em horários, datas e locais
inespecíficos, fazendo incidir a legislação respectiva para coibir
exemplarmente os infratores, comunicando a este Juízo as ações
implementadas e os resultados.
Bel. Antonio Josimar Almeida Alves
Juiz de Direito – 1ª Vara
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